Sabor e História: Uma Confeitaria Original em Amakusa

Doces à base de figo trazido para o Japão pelos portugueses

E se a personagem histórica Amakusa Shiro tivesse tido um primeiro amor?

Esta é a ideia original que levou Miyose-san a criar um produto novo, e a registar a sua marca em Amakusa. Este chef pasteleiro, que estudou em Nagasaki, voltou à sua terra natal de Amakusa para aqui estabelecer a sua confeitaria. Tendo um fascínio especial pelos doces de origem portuguesa, que no Japão já se tornaram parte da sua própria cultura gastronómica, Miyose-san começou a pensar em criar um doce novo com a matéria prima mais nobre: a doce fruta portuguesa. Com efeito, os figos foram introduzidos no sul do Japão pelos portugueses há mais de 400 anos, tendo sido uma cultura de sucesso logo naquela época. Cartas de missionários do século XVII dão conta das encostas de toda a prefeitura de Kumamoto cobertas de figueiras! Essas mesmas figueiras foram depois melhoradas pelos agricultores japoneses através da mistura com tipos de figos mais resistentes às características do clima, e que ficam também maiores quando amadurecem, nomeadamente através da incorporação de tipos de figueiras de origem californiana. Hoje em dia, Kumamoto tem uma vasta produção de figo, e é a partir daí que este chef adquire o ingrediente principal para o seu doce mais recente. Amakusa é uma ilha no sul da prefeitura de Kumamoto. Nos dias de hoje, os seus laços sociais, comerciais e administrativos são com Kumamoto, mas a sua história está mais marcada pelos eventos da vizinha prefeitura de Nagasaki. Uma espreitadela ao mapa esclarece-nos de imediato. Entre Amakusa e as várias partes da prefeitura de Nagasaki, a comunicação teria sido muito conveniente por via marítima, e as viagens de barco eram precisamente a forma preferencial de deslocação nos séculos XVI e XVII.

Amakusa Shiro foi um jovem de Amakusa, de família nobre e predestinado a governar o território. Cresceu num clima cultural muito diferente daquele que se vivia na então capital de facto do Japão (Edo, onde estava estabelecido o Shogunato Tokugawa; apesar de a família imperial estar em Quioto), já que a sua educação era equivalente à de um príncipe renascentista europeu, dentro do cristianismo. Todos os seus vassalos estavam de algum modo envolvidos com a nova cultura que se espalhava no sul do Japão, e portanto em discordância política com as vagas de controlo que vinham do Shogunato Tokugawa. Entre os vários motivos para a resistência estavam os impostos pesados, a falta de reconhecimento dos direitos dos cidadãos quanto à liberdade de culto, e de modo geral o sistema de exploração feudal que se impunha nessas partes do território. O jovem Shiro tinha apenas 16 anos, não era um samurai com experiência de batalha, e possivelmente teve pouco ou nenhum papel na liderança efetiva do que mais tarde se veio a chamar "A Revolta de Shimabara", mas o seu nome está para sempre gravado como o herói daqueles eventos sangrentos. Por ter sido de certo modo uma vítima do destino, e com tão precoce desfecho, a sua imagem para a generalidade dos japoneses é a de um rapaz belo e culto, de modos suaves, atitude contida, cristandade devota, recato e um certo encanto angelical. Assim sendo, este chef imaginou como teria sido o primeiro enamoramento platónico de Shiro, talvez apenas um romance de olhares, doce e inocente, com uma rapariga da sua corte. Dessa ideia nasceram vários produtos: um doce de figo com 60% de pura fruta e sem conservantes, figo desidratado e cristalizado em açúcar para conservação, e pastéis de massa com recheio de figo.

A confeitaria incorpora a modesta fábrica, com 15 trabalhadores, e um café-loja, onde pode comprar os produtos tanto em pacotes de tamanho familiar como em doses individuais. Pode degustar vários tipos de doce que esta pequena fábrica produz em conjunto com chás diversos e também outras bebidas, com ou sem álcool. Miyose-san também produz um gelado baseado no pastel de nata! É de facto uma loja encantadora, com música de fundo de guitarra portuguesa e um simpático Galo de Barcelos na entrada. O nome da loja é S.PORT porque se localiza mesmo ao lado do porto marítimo (S = spot/ponto; PORT = porto marítimo), um nome que também evoca a origem da relação gastronómica entre Portugal e o Japão, já que tudo começou pelas viagens marítimas. Existe parqueamento gratuito e nas proximidades também pode visitar a bela loja de tecidos "saraça" da senhora Isuzu-san.

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